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A tramoia de Zambelli também expõe as Forças Armadas

 


 

Por Rodrigo Martins

Editor-executivo da Carta Capital

Em 04/08/2023.

A deputada federal Carla Zambelli, do PL paulista, precisou entregar o passaporte e todas as suas armas à Polícia Federal.

A medida cautelar não tem relação com o fato de a parlamentar ter perseguido um homem negro pelas ruas dos Jardins, região paulistana de bairros abastados, com uma pistola em punho, às vésperas do segundo turno das eleições de 2022. O que assombra a bolsonarista, alvo de mandados de busca e apreensão cumpridos por agentes da PF na quarta-feira 2, é a exposição de suas tramoias golpistas.

Nesta mesma data, o hacker Walter Delgatti Neto, protagonista do escândalo da “Vaza Jato”, foi preso. Recentemente, ele confessou ter sido contratado pela parlamentar para invadir o sistema da Justiça Eleitoral, bem como o celular e o e-mail de Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal e então presidente do Tribunal Superior Eleitoral, durante as eleições de 2022. O objetivo era demonstrar a suposta fragilidade do sistema eleitoral, tese explorada à exaustão por Jair Bolsonaro para justificar a liderança de Lula nas pesquisas e, depois, a derrota nas urnas.

Em depoimento à PF, o hacker disse que a deputada o contratou em setembro passado, durante um encontro sigiloso às margens de uma rodovia. Delgatti não conseguiu acessar as urnas eletrônicas, sem conexão com a internet, nem o celular de Moraes. Teve, porém, acesso aos e-mails antigos do magistrado, mas não encontrou nada comprometedor. Agora surgem evidências de que ele também inseriu documentos falsos no Banco Nacional de Mandados de Prisão, sob a tutela do Conselho Nacional de Justiça. Entre as adulterações figuravam alvarás de soltura de indivíduos presos por motivos diversos e um mandado de prisão expedido contra Moraes.

Depois de ter desfilado na companhia de Delgatti por meses, Zambelli agora diz ter contratado o hacker apenas para fazer a integração de seus perfis nas redes sociais com o seu site oficial. Nega qualquer acerto para devassar a vida de Moraes, mas está cada vez mais difícil sustentar essa versão. 

Em julho, Valdemar Costa Neto, presidente do PL, confirmou que a parlamentar apresentou o hacker à direção do partido durante a campanha de 2022. Segundo ele, Delgatti teria pedido um emprego, mas não foi atendido. O especialista em invadir sistemas também teria sido apresentado a Bolsonaro, com ideia fixa de que as urnas eletrônicas poderiam ser violadas. 

Não bastasse, Delgatti agora afirma à PF que o relatório das Forças Armadas sobre a fiscalização do processo eleitoral se baseou em suas “explicações”. De acordo com o advogado Ariovaldo Moreira, defensor do hacker, seu cliente esteve em reuniões no Ministério da Defesa. “Ele realmente esteve lá e prestou algum serviço, mas ele também recebeu propostas de invasões”, disse o advogado em entrevista à GloboNews.

Ao convocar uma coletiva de imprensa na Câmara dos Deputados, a parlamentar convidou colegas do PL e de outros partidos para acompanhá-la. Apenas meia dúzia de gatos-pingados compareceram. Pudera. Além das revelações feitas por Delgatti e Costa Neto, a PF identificou pagamentos feitos pelo staff da parlamentar ao hacker. “Verifica-se que, do montante de R$ 13.500,00, a quantia de R$ 10.500,00 foi enviada por RENAN CÉSAR SILVA GOULART, valendo-se de 3 transferências bancárias via PIX; e que o valor de R$ 3.000,00 foi enviado, numa única transferência bancária via PIX, por JEAN HERNANI GUIMARÃES VILELA”, informa a decisão do Supremo Tribunal Federal que autorizou os mandados contra Zambelli.

Goulart é assessor do deputado estadual Bruno Zambelli, do PL paulista, irmão de Carla. Já Vilela é funcionário do gabinete da parlamentar. Diante das evidências apresentadas pela PF, a deputada bolsonarista não teve como negar os pagamentos, mas insiste que eles correspondiam ao suposto trabalho executado por Delgatti em seus perfis nas redes sociais e site oficial. 

A participação do hacker na auditoria feita por oficiais do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, apontados como “especialistas em Tecnologia da Informação e defesa cibernética”, é mais uma nódoa na reputação das Forças Armadas. Depois de proteger os acampamentos golpistas na porta de quartéis, corretamente classificados como “incubadoras de terroristas” pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, a cúpula militar agora busca, a todo custo, apagar as próprias digitais na intentona bolsonarista de 8 de janeiro. 

À frente de um Inquérito Policial Militar sobre o tema, o coronel Roberto Jullian da Silva Graça, chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Planalto, concluiu há pouco que as tropas responsáveis pela segurança do Palácio do Planalto não tiveram qualquer responsabilidade pela invasão dos golpistas. Se o governo recém-instalado tivesse feito um planejamento adequado, sustenta o coronel, teria sido possível reforçar o efetivo e evitar a entrada da horda bolsonarista ou, pelo menos, ter minimizado os estragos. 

Convenientemente, o inquérito ignora um fato decisivo para o desfecho da trama golpista. A PF tentou remover o acampamento dos extremistas em frente ao QG do Exército, em Brasília, ainda em dezembro, mas oficiais do Exército não permitiram a ação. “Quando nós fomos de novo lá, no dia 8 de janeiro, tinha tanque de guerra no meio da rua, impedindo que a polícia entrasse para retirar aquelas pessoas do acampamento. Então, isso é uma sequência”, lembrou o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, no mesmo dia em que o relatório do coronel Graça foi revelado pela mídia.

Muito antes de os brasileiros comparecerem às urnas nas eleições de 2022, CartaCapital vinha alertando seus leitores sobre as tramoias golpistas de Bolsonaro e as movimentações de Zambelli com o hacker da “Vaza Jato”, além de apontar as frágeis alegações das Forças Armadas para colocar em dúvida a lisura do processo eleitoral. Uma a uma, as mentiras espalhadas pela extrema-direita durante a campanha de 2022 estão ruindo, sobretudo com o avanço das investigações da PF sob a supervisão da Suprema Corte. 

Ainda assim, parlamentares bolsonaristas continuam a propagar fake news sobre o 8 de janeiro, buscando responsabilizar o governo que seria golpeado, e não os golpistas que devastaram as sedes dos Três Poderes.

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