A mobilização dos
Coletes Amarelos ocupa as manchetes da imprensa nacional e chama a atenção do
mundo, surpreendeu a sociedade francesa e se diferencia de várias formas das manifestações
que se costuma ver.
Caracteriza-se por ser um movimento não articulado, apartado de partidos,
sindicatos ou outras organizações tradicionais; e protagonizado por cidadãos em
sua maioria alheios à política e que no curso dos acontecimentos foram
radicalizando suas posições e ações.
Observa-se as suas raízes profundas, onde os mais de 30 anos de “liberalismo”,
levaram a destruição dos serviços públicos, do poder aquisitivo dos salários,
da saúde e da educação.
Nessa regressão social quase dez milhões de pessoas, segundo os
institutos de pesquisa, vivem mal, abaixo da linha de pobreza.
Os Coletes Amarelos representarão para o século XXI o que
as manifestações estudantis de maio de 68 representaram para o século XX.
Tomara que se espalhe com rapidez para os outros países e que se recupere de
vez a construção de uma sociedade mais justa, igual e fraterna. Para o conjunto das populações e não apenas para o enriquecimento desenfreado de poucos.
DECLARAÇÃO DA IVª INTERNACIONAL
A revolta dos coletes amarelos, primeiro sintoma de um movimento que amadurece em toda a Europa
A
revolta dos coletes amarelos que surgiu na França, fora do controle das direções
tradicionais, dos partidos e dos sindicatos, e que em menos de um mês cobriu
todo o país, é o primeiro sintoma de um movimento que amadurece nas profundezas
da classe operária e das massas populares de todos os estados europeus.
É o
aparecimento, à luz do dia, desta maioria da população empobrecida e
progressivamente excluída dos seus direitos fundamentais, pelas sucessivas
políticas de contra-reformas ditadas em toda a Europa pelo capital financeiro e
coordenadas pelas instâncias da União Europeia.
É a voz
de todos os que, há anos, estavam reduzidos ao silêncio, a voz dos assalariados
mal-pagos, dos trabalhadores precários, das mães solteiras, dos pequenos
artesãos, dos jovens, dos aposentados que vivem no limiar da pobreza.
É a voz
das populações privadas dos serviços de saúde pelo fechamento de hospitais regionais,
privadas dos serviços públicos essenciais pelas “reorganizações” sucessivas dos
correios, das ferrovias… voz retomada pela juventude secundarista e universitária.
Eles
organizaram-se espontaneamente para bloquear as rotatórias em todo o país, sem
a autorização das direções que supostamente os representam, e que não pararam
de acompanhar, durante décadas, as políticas de contra-reformas dos sucessivos
governos, multiplicando “jornadas de luta” sem futuro.
Eles
organizaram-se por si próprios, recusando os “porta vozes” que, de todos os
lados, tentaram levar à mesa de um “grande pacto de concertação” dos “parceiros
sociais” e dos representantes da sociedade civil, para fazê-los abandonar o grito
de guerra que concentra a rejeição de toda a política deste governo: “Macron,
demissão!”.
A sua
força: o apoio – apesar das provocações e das violências organizadas pelo
Estado – da imensa maioria da população francesa.
“Protesta-se à francesa, porque os protestos pacíficos conduzidos até agora não deram nenhum resultado”
Não há
qualquer exagero em dizer hoje, que a revolta dos coletes amarelos - seja qual
for o resultado imediato deste movimento –, goza desde já da simpatia
instintiva dos trabalhadores e dos povos de toda a Europa, como o testemunham
os ferroviários alemães em greve manifestando-se com coletes amarelos ou os aposentados
espanhóis, ou, ainda, estes agricultores poloneses que bloquearam uma
autoestrada em direção a Varsóvia, vestidos com coletes amarelos, declarando: “Protestamos
à francesa, porque os protestos pacíficos conduzidos até agora não deram nenhum
resultado”.
É esta
simpatia instintiva que faz entrar em pânico todos os chefes de estado e de
governo europeus.
Todos
sabem que um laço forte – a rejeição da política ditada pelo capital financeiro
- liga o voto a favor do Brexit do dia 16 de Junho de 2016 na
Grã-Bretanha, à derrota de um Renzi na Itália (duplamente sancionado quando do
referendo de 2016 e nas legislativas de 2018), passando pela crise na Alemanha
dos dois partidos CDU (democracia-cristã) e SPD (social-democracia) - tomando no
SPD o caráter de verdadeiro colapso - que compartilharam o poder desde a guerra
para assegurar a manutenção da ordem social estabelecida.
Eles calculam
a devastação provocada pela política de austeridade adotada por todos os
governos europeus para fazerem os trabalhadores e os povos pagarem os bilhões
de dólares que desapareceram durante a crise financeira de 2008.
Eles
medem a profundidade do caos para o qual as velhas nações europeias são
inexoravelmente conduzidas pela política de destruição de todas as conquistas
políticas e sociais arrancadas na Europa após a segunda guerra mundial.
Eles
sabem o preço pago pelo povo grego com o “pacto de estabilidade e de
crescimento”, eles temem que a vez da França e da Itália se aproxime.
Eles
compreendem que a revolta dos coletes amarelos na França, não é senão o
primeiro chacoalhão de um tremor de terra que se prepara para abalar toda a
Europa.
Não, senhores pregadores de lições de moral, os trabalhadores e os povos rejeitam com desprezo as acusações de “nacionalismo” e de “populismo”
É para
tentar afastar essa ameaça que a campanha de calúnias, acusando os
trabalhadores e os povos de “populismo” e de “xenofobia”, volta com força.
Tudo tem
sido feito na França por todos que este país conta como politicólogos,
sociólogos e, por vezes, dirigentes de organizações operárias, para
desacreditar e colocar sob suspeição o movimento dos coletes amarelos, acusados
de conluio com a extrema direita. Em vão.
Não,
senhores pregadores de lições de moral, os trabalhadores e os povos rejeitam
com desprezo as acusações de “nacionalismo”, de “populismo” e de “xenofobia”.
Eles
recusam, muito simplesmente, se verem privados das prerrogativas que são
teoricamente as suas numa democracia. Eles recusam renunciar ao seu direito de
exercer a sua soberania, para que ela seja transferida a um “soberano
republicano” ou para instituições supranacionais incontroláveis, a serviço
exclusivo dos setores dominantes do capital financeiro.
É o que
eles têm dito durante mais de um mês na rua em toda a França.
Eles abriram uma brecha
A
revolta dos coletes amarelos abre um novo período na Europa. Eles abriram uma
brecha. Eles criaram, ao ocuparem as rotatórias, uma forma de organização que
lhes permitiu escapar do ferrolho imposto pelas direções burocráticas das
organizações de classe. Eles encontraram uma forma de organização que lhes
permitiu manter o controle do seu movimento.
Dando
ênfase às assembleias democráticas, eles começaram a dar um princípio de
resposta à questão que persegue o movimento operário, a quem tem sido proibido,
há meses e meses, juntar as suas forças para o choque e afrontar o governo
representante dos interesses do capital financeiro. Pode-se dizer, sem medo de
se enganar, que a revolta dos coletes amarelos deixa, desde já, a sua marca em
todos os desenvolvimentos da situação europeia.
Em Bruxelas e em Berlim, inquietam-se
Os
coletes amarelos torpedearam, abalando o poder de Macron, a sua pretensão de se
apresentar como o dirigente capaz de preencher o vazio deixado por Merkel,
contestada no seu país, e conduzir a recuperação das instituições da União
Europeia em plena crise.
Eles
puseram em causa, além disso, o cenário político previsto para as eleições do
“Parlamento” Europeu que deveria articular-se em torno da falsa oposição de
dois campos, o campo dos “progressistas”, que deviam unir-se atrás de Macron,
contra o campo dos “populistas eurofóbicos”. Este campo dos “progressistas”
perdeu o seu campeão...
A quatro
meses da eleição para o “Parlamento” Europeu, pode-se predizer que estas
eleições serão marcadas pela abertura de uma nova etapa na decomposição de
todos os velhos partidos ligados à salvação da ordem
vigente, que se manifestará – seja qual for a sua forma em cada país – por uma
poderosa rejeição, comum a todos os povos, da política do capital financeiro e
das instituições da União Europeia ao seu serviço.
Em
Bruxelas e em Berlim, inquietam-se pelas “concessões” feitas por Macron sob
pressão da rua e duvida-se, publicamente, da capacidade do governo francês
prosseguir com as “reformas” que iniciara.
Teme-se,
no momento em que o Banco Central Europeu e o FMI anunciam a ameaça de
repetição da crise financeira europeia dos anos 2010-2011, que o conjunto do
“Pacto de estabilidade e de crescimento” seja posto em questão.
O pânico atinge, um
depois do outro, todos os chefes de Estado e de governo.
Eles pressentem que
a revolta do que a imprensa chamou com desprezo “a França periférica”, também
se prepara em cada um dos seus países, e constitua o primeiro abalo de um
movimento mais vasto dirigido contra as próprias bases do sistema baseado na
propriedade privada dos meios de produção.
É difícil, de fato,
imaginar que os eleitores das circunscrições operárias do Labour
(Partido Trabalhista ingles), que votaram massivamente no Brexit,
ficarão satisfeitos com o acordo (ou o não-acordo), qualquer que seja, assinado
pelo Governo britânico com a União Europeia.
É difícil imaginar
que eles não prosseguirão o combate para revogar as leis anti-sindicais de
Thatcher, para revogar o arsenal jurídico que desregulamenta o trabalho, para
renacionalizar as ferrovias e para restabelecer o Sistema Nacional de Saúde
posto em perigo pelas políticas de austeridade.
Quem pode acreditar
que, na Alemanha, a rejeição pelas massas da Grande Coligação e dos seus
partidos, a CDU e o SPD, que se expressou nas últimas eleições regionais, não
vai procurar prolongar-se no terreno de uma ação direta para se libertar do
jugo do “Pacto de Estabilidade” e impor, pela força, o abandono da “Agenda” e
da “regra de ouro” orçamentária (que condenam todos os serviços públicos, a
começar pelo sistema hospitalar)? Quem pode acreditar que este movimento não
fixará como objetivo restabelecer o sistema dos contratos coletivos de
trabalho?
Quem pode acreditar
que, na Itália, os trabalhadores – que correram Renzi do poder para acabar com
o plano de contra-reformas imposto pelo capital financeiro – vão suportar, por
muito mais tempo, as incoerências dos aventureiros Salvini/Di Maio do atual
governo, aos quais Renzi abriu as portas do poder?
Quem pode acreditar
que na Espanha, depois da queda de Rajoy, substituído por um governo do PSOE
(socialista), o anúncio de um aumento do salário mínimo possa bastar para
responder a todas as exigências sociais e democráticas esmagadas, durante anos
e anos, pelo regime monárquico?
No alto, governos em crise
Dirigentes que
perderam o essencial da sua base social nos respectivos países. Quem irá cair primeiro?
Theresa May, Angela Merkel ou Emmanuel Macron? É difícil responder a questão.
Dirigentes que perderam todo o controle dos acontecimentos, todo o controle da
vida de setores-chave da economia nacional, submetidos aos golpes dos
monopólios imperialistas que desprezam as fronteiras e as regulamentações
nacionais.
Uma situação que
confirma que, no quadro do sistema da propriedade privada dos meios de
produção, a Europa é inexoravelmente posta de fora de setores determinantes do
mercado mundial pela “guerra comercial” declarada por Trump e o imperialismo
norte-americano.
As economias
nacionais do continente europeu são desmanteladas pela reorganização permanente
das “cadeias de valor”, feita pelos monopólios imperialistas, para concentrarem
as suas produções nas zonas de baixo salário.
A Europa, entalada
entre os interesses contraditórios das diferentes burguesias nacionais,
inexoravelmente condenadas à decadência pelo desencadear da “guerra comercial”,
conduzida por Trump, é incapaz de se dotar de uma política comum (fiscal,
orçamental e financeira) para pretensamente fazer face aos golpes do
imperialismo norte-americano.
A sua única política
comum reduz-se à política coordenada de destruição, em toda a Europa, de todas
as conquistas sociais arrancadas pela classe operária depois da Segunda Guerra,
para assegurar as condições de sobre-exploração exigidas pelo capital
financeiro em crise.
Embaixo, a aspiração irreprimível das mais largas massas a sair do caos
Em baixo, uma força
imensa procura abrir caminho. Uma força que tem consciência de se encontrar, em
cada país, face a um único e mesmo plano ditado pelo capital financeiro e
implementado pelos seus delegados que estão no poder. Uma força que, como acaba
de o demonstrar, considera que é seu dever acabar com o mecanismo de degradação
que arrasta cada país para um processo de desmoronamento e procura libertar-se
dos entraves com os quais as direções dos velhos partidos operários e das
organizações de classe impediram, desde há muitos anos, os trabalhadores e as
massas populares de se levantarem contra os respectivos governos. É a aspiração
irreprimível das largas massas a saírem do caos para o qual o sistema da
propriedade privada dos meios de produção, em plena crise, as empurra. A
aspiração a recuperar a sua soberania para, à escala de toda a Europa, arrancar
o poder das mãos do capital financeiro a fim de reorganizar em todo o
continente os transportes, a energia, a indústria e as infraestruturas ao
serviço de todos os trabalhadores e de todos os povos, no quadro dos Estados
Unidos Socialistas da Europa.
Em toda a Europa, a
rejeição da política ditada pelo capital financeiro atingiu os velhos partidos que se reclamam da defesa dos
interesses operários e da democracia e que se subordinaram aos respectivos governos
e ao capital financeiro, abrindo uma crise no seu seio e conduzindo alguns à
beira da implosão.
Em todos os países
do continente europeu, reagrupamentos de militantes, saídos do encontro de
elementos vindos destes partidos e da jovem geração de militantes, procuram
organizar-se para tentar ajudar a classe operária a abrir, pela luta de
classes, a via de uma saída política conforme à defesa dos seus interesses de
classe e à reconquista da democracia.
Em vésperas de
acontecimentos decisivos, o Secretariado Internacional da 4ª Internacional
convida todos os militantes e os trabalhadores empenhados nesta procura a
debater, com os seus militantes, os meios a pôr em prática para ajudar a fazer
convergir o combate de todos os povos da Europa.
O Secretariado
Internacional da 4ª Internacional compromete-se a fazer tudo o que estiver ao
seu alcance para ajudar a esta mudança, ultrapassando o quadro estreito das
fronteiras nacionais e a enriquecendo-se com a diversidade das experiências
nacionais de cada um. Em relação com os desenvolvimentos iminentes da situação,
compromete-se a trabalhar para a organização de reuniões e encontros europeus,
necessários para estreitar os laços entre todos os que procuram contribuir para
a preparação dos gigantescos combates de classe que se anunciam.
O Secretariado
Internacional da 4ª Internacional
19 de Dezembro de 2018
19 de Dezembro de 2018
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